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Simpósio Internacional Lusófono abre caminho à harmonização regulamentar dos ensaios clínicos
O Simpósio Internacional Lusófono “Harmonização regulamentar e processual lusófona para Ensaios Clínicos: é possível?” realizou-se a 25 de setembro, na Ordem dos Farmacêuticos, em Lisboa, com 110 participantes presenciais e 120 online. A iniciativa assinalou o primeiro ano do projeto CT-Luso – Capacitação Ética e Regulamentar nos PALOP, apoiado pela União Europeia no âmbito do programa EDCTP3, que visa alinhar processos regulamentares e éticos na investigação clínica nos países africanos de língua portuguesa.
O evento reuniu autoridades de saúde, comissões de ética, especialistas e Embaixadores de Portugal, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe, promovendo a partilha de experiências, atualização sobre desenvolvimentos recentes e fortalecimento das redes lusófonas. Veja a galeria de imagens aqui.
Do multilateralismo à sessão de abertura
Na sessão inaugural, Helder Mota Filipe, bastonário da Ordem dos Farmacêuticos e coordenador do CT Luso, destacou o esforço coletivo do projeto para aproximar sistemas e alinhar práticas nos países lusófonos, promovendo proximidade, cooperação técnica e harmonização regulamentar no setor da investigação clínica. “É desta convergência que nascerão não só melhores condições para os promotores, mas também ganhos concretos para os sistemas de saúde, para os investigadores e, sobretudo, para as populações”, sublinhou.
De seguida, a coordenadora do projeto Maria do Céu Patrão Neves considerou que estamos perante uma oportunidade para os países africanos lusófonos que não pode ser adiada. “Cada euro investido em ensaios clínicos tem um retorno de 200% e os PALOP têm um horizonte imenso de crescimento: afinal, a média de ensaios clínicos na África lusófona é de 0,04%, quando comparada com a de África, que é de 2,02%, em relação ao resto do mundo”, sublinhou.
Na sessão de abertura, André Dias Pereira agradeceu o convite feito ao Centro Biomédico da Universidade de Coimbra para colaborar na vertente jurídica do CT Luso, sublinhando a relevância da “dinâmica de multilateralismo e respeito mútuo” que o projeto tem vindo a afirmar “num mundo em transformação e em processo de reconstrução de equilíbrios”.
No início do simpósio, intervieram também Rui Santos Ivo, Presidente do Infarmed, e Pedro Barata, Vice-Presidente da CEIC, sublinhando a importância de fortalecer a cooperação entre os países de língua portuguesa, de modo a impulsionar o progresso da investigação clínica no espaço lusófono.
A secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Ana Isabel Xavier, saudou a iniciativa, através de uma mensagem de vídeo, considerando que “a diplomacia da saúde é uma das ferramentas mais valiosas que temos entre mãos para concretizar os objetivos do desenvolvimento sustentável da agenda 2030 assegurando que ninguém fica para trás”.
Radiografia jurídico-institucional
Após a sessão de abertura, subiram ao palco os intervenientes dos diferentes países para traçar a “Radiografia jurídico-institucional lusófona”, com moderação da consultora do projeto CT Luso, Maria Alexandra Ribeiro.
De Angola, Mutombo Mavunza, Pombal Mayembe e Moisés Francisco defenderam a necessidade de aprovar regulamentos nacionais específicos, acompanhados por um reforço das capacidades técnicas e institucionais. Sublinharam igualmente a importância da participação ativa na rede lusófona e do compromisso em garantir ensaios clínicos éticos e seguros.
Cabo Verde esteve representado por João Semedo, Eduardo Tavares e José António Reis. Os cabo-verdianos consideraram que a harmonização regulamentar e processual lusófona não só é possível, como um imperativo, concretizando-se através da adoção de princípios éticos internacionalmente aceites com vinculatividade jurídica, ajustados à realidade local sem comprometer esses padrões.
Da Guiné-Bissau, Miguel Pereira, Carlos Costa e Mouhammed Djicó destacaram os avanços institucionais já em marcha e assinalaram lacunas jurídicas estratégicas na legislação sobre investigação biomédica, a qual é essencial para proteger os sujeitos envolvidos.
Moçambique esteve representado por Virgílio Uamba, Tânia Sitoie e Esperança Sevene, que salientaram os progressos na área de ensaios clínicos com legislação aprovada e competências clarificadas, assim como medidas em curso para agilizar revisões e melhorar o ambiente de pesquisa, mas alertaram para a necessidade de informatizar os procedimentos.
De São Tomé e Príncipe, Neidyne Afonso, Hironisia dos Santos e Eula Maquengo sublinharam a importância de aprender com a experiência de outros PALOP e de adaptar soluções legislativas locais, destacando que a harmonização é possível desde que haja alinhamento de requisitos entre autoridades reguladoras e otimização dos processos internos, desde a condução dos estudos ao recrutamento de participantes e gestão de dados, para aumentar a eficiência do sistema nacional.
Diplomacia e compromisso político
Na mesa-redonda com os Embaixadores africanos acreditados em Portugal, moderada por Maria do Céu Patrão Neves, o embaixador de São Tomé e Príncipe, Esterline Gonçalves Género, recordou que a ciência pode ser motor de desenvolvimento: “O governo de São Tomé e Príncipe encara este projeto não apenas como uma iniciativa científica, mas como uma verdadeira oportunidade de desenvolvimento desta área no país.”
De Moçambique, a embaixadora Stella Novo Zeca apelou à cooperação lusófona: “Temos de quebrar barreiras, reduzir burocracias e reforçar as ligações entre os nossos países. Só assim poderemos transformar intenções em resultados.” A diplomata considera que “estamos numa nova era: todos os nossos países completaram 50 anos de independência, é tempo de fazer diferente”.
O embaixador da Guiné-Bissau, Artur Silva, trouxe para a discussão a questão da formação: “Entre 2014 e 2024, mais de 7.500 jovens guineenses vieram estudar para Portugal. Apenas 159 concluíram os cursos — cerca de 2%”. É fundamental criar condições para que os estudantes guineenses terminem a formação e regressem para contribuir para a investigação clínica no país, acrescentou.
Já a Encarregada de Negócios da Embaixada de Cabo Verde, Ana Pires, sublinhou que para desenvolver a área dos ensaios clínicos na África lusófona “não basta apenas ter instituições e legislação: precisamos de financiamento. Depois de aprovar a ajuda necessária, é preciso ter o quadro regulatório e promover boas práticas. No caso de Cabo Verde, já possuímos esse enquadramento; agora é preciso unir a teoria à prática”.
O encerramento do Simpósio Internacional Lusófono foi da responsabilidade de Esperança Sevene, coordenadora científica do projeto, que defendeu a importância de utilizar a língua portuguesa no processo legislativo e na produção de normas, para evitar ruído de tradução e assegurar que os decisores políticos compreendem de forma clara os textos legais.
O simpósio incluiu também a inauguração da exposição “Sentidos da África Lusófona”, que apresentou objetos de arte (descrever aqui alguns para valorizar) e gastronomia dos países participantes, reforçando a dimensão cultural e identitária da iniciativa.